15 / November / 2022
A doce Carolina é uma gota no oceano de pessoas abafadas pela opressão e vergonha de assumir a magoa que existe ao fim do dia.
Uma nota de pesar é algo simples e “fácil” de se fazer, até existem protocolos para isso, mas tem sido muito difícil dissociar o profissionalismo do sentimento de amizade que tínhamos pela Carolina. Já correram muitas linhas com motivos e justificações sobre o que aconteceu, voltou a falar-se da saúde mental e da urgência de estarmos atentos. Já formos deparados com tantos acontecimentos e ao mesmo tempo nada muda.
É importante passarmos dos esquemas e da teoria à ação, deixarmos de lado os falsos moralismos e as nobres publicações nas redes sociais e sermos mais humanos no dia-a-dia, que é isso que faz a diferença.
Quem conhecia a Carolina sabia que era uma menina inteligente, cuidadosa, querida e muito preocupada com os outros. Mesmo com o turbilhão de emoções que lhe corriam presenteava todos com a sua doçura e o seu sorriso. A AEVP, quer fazer sentir que na nossa profissão temos de lidar situações e emoções divergentes no dia-a-dia, quem trabalha com vidas é assim mesmo. A nossa imagem é passada para fora como os que “andam com os animais que adoram ao colo e a fazer miminhos”, e isto abafa o que não partilhamos: a perda, a injustiça, o stress, o excesso de trabalho, a incapacidade de salvar todas as vidas no decorrer do dia, a gestão dos clientes e tantas outras causas que nos levam a um esgotamento. É fundamental criar uma rede de ajuda, até fiscalização sobre as equipas e horários de trabalho, que a formação sobre saúde mental não se limite a webinares esporádicos, mas sim que seja lecionada desde a faculdade, ou diríamos até desde o ensino básico e que haja formação continua orientada para a futura profissão.
A Veterinária é muitas vezes vista pela sociedade como uma profissão de bons samaritanos que têm a obrigação de cuidar dos animais, sendo apenas nós os responsáveis por tal. O facto de nós trabalharmos com paixão imensa, não anula que sejamos pessoas a ganhar a vida, contas para pagar e tudo o resto, por isso é importante ressalvar que o problema é mesmo muito maior e tem muitas ramificações a tratar, por isso é urgente que comecemos por algum lado.
Infelizmente, a doce Carolina é uma gota no oceano de pessoas abafadas pela opressão e vergonha de assumir a magoa que existe ao fim do dia. Expressamos mais uma vez um imenso pesar pelo falecimento da nossa amiga. Neste momento de dor e tristeza a AEVP está solidária com a família, amigos e com os colegas da Clínica Veterinária do Carandá.